(39) PASTA DE RECORTES
Carl G. Jung
percebeu que uma das manifestações mais comuns da mente inconsciente (mente
coletiva) era a sensação fundamental de unicidade
e unidade com tudo o que existe. Para ele essa
experiência, como o próprio inconsciente coletivo, é universal. Carl G. Jung
chamou-a de “concórdia transcendental”, que coloca o indivíduo em contato com a
Mente Una, aquilo a que as diferentes religiões dão o nome de Deus. E, para
ele, em última análise, a mente universal e a mente
individual são a mesma coisa, isto é, nossa mente é a Mente. Essa é uma
verdade perfeitamente aceita no Oriente e, embora no Ocidente isso pareça
blasfêmia, Jung afirmava que essa percepção era uma experiência mística incontestável, presente em todas as
tradições religiosas, do Oriente e do Ocidente.
(Hoje, no
Ocidente, a física quântica afirma a mesma coisa: só existe uma mente e nós
somos essa mente).
James Jeans: ‘No
espaço e no tempo, nossas consciências são indivíduos separados. Mas, além do
espaço e do tempo (isto é, além do ego, no atemporal), elas talvez formem uma única
e contínua corrente de vida. O que acontece com a eletricidade e o magnetismo
pode acontecer com a vida: os fenômenos podem ser indivíduos carregando
existências separadas no espaço e no tempo, enquanto que, na realidade mais
profunda, além do espaço e do tempo, podemos ser todos nós membros de um só
corpo’ (‘Eu e o Pai somos um’; ‘somos todos membros do Cristo’. O
espectro-teclado das vibrações cósmicas, embora uma ‘única e continua corrente
de vida’, nos apresenta existências aparentemente separadas: ondas de rádio,
calor, som, luz, eletricidade, magnetismo, corpos químicos, sensações de tato,
visão etc. Isso pode estar ocorrendo com as diferentes formas de vida: eu, você,
os animais, vegetais, minerais, embora indivíduos de existências separadas
quando no espaço-tempo, numa realidade mais profunda, além do espaço-tempo,
podemos ser um só corpo, uma única vida, uma única Mente).
O modo que ensina
o que fazer para alcançar a percepção da Realidade Final constitui a própria
essência do Hinduísmo, Budismo, Taoísmo, Sufismo etc. (as grandes tradições
orientais) e é sempre um conjunto de instruções sobre como fazer despertar o
modo não-dual de conhecer, um modo em que se percebe que nós, o sujeito, e os
objetos, as coisas que observamos, não são separados, não são duas coisas, mas
são interdependentes e são uma coisa só e, assim, conhecer, diretamente, a
Realidade (Jesus: ‘Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará’). Essas
instruções variam muito de cultura para cultura, cada uma tendo seu próprio
grupo particular de regras, porque seus símbolos são sempre diferentes. Mas,
sempre e onde quer que as instruções levem ao modo não-dual de conhecer, a
Realidade experimentada é idêntica, é a mesma, tanto que Einstein, Jung e
outros notáveis a chamaram de ‘experiência de concordância universal’.
Schrondinger: ‘Por
mais inconcebível que pareça à razão comum, ao nosso modo de conhecer
ordinário, dualístico, isto é, nós ‘aqui’, e o que conhecemos, ‘lá’, separado
de nós, nós e todos os seres conscientes somos tudo em tudo. Daí que a vida que
estamos vivendo, não seja apenas um fragmento da existência inteira, mas, em
certo sentido, é o Todo (a vida total)... Assim, podemos atirar-nos ao chão,
estender-nos sobre a Mãe Terra, com a convicção absoluta de estarmos em
comunhão com ela e ela conosco. Estamos firmemente estabelecidos e somos tão
invulneráveis como ela; na verdade, mil vezes mais firmes e mais invulneráveis.
Tão certo quanto ela nos engolirá amanhã, trar-nos-á outras vezes novas lutas e
novos sofrimentos. E não somente ‘algum dia’. Agora, hoje, todos os dias, ela
nos traz à vida, não uma só vez, mas milhares e milhares de vezes, exatamente
como nos engole, todos os dias, milhares e milhares de vezes’.
Com a nova visão
dada pela física quântica, verificamos que os conhecimentos que temos do mundo
desmoronam completamente, pois vemos, na base do mundo físico, não garantia de
certeza, mas um Princípio de Incerteza (Heisenberg), isto é, o fluir dos eventos
e fenômenos é totalmente imprevisível e, portanto, incerto; na base do mundo
mental, um Teorema de Incompletude (Kurt Gödel), isto é, nenhuma observação é
completa; sempre alguma coisa fica de fora; nunca podemos observar ou estudar,
conhecer o mundo todo. Descobrimos, até, que ‘toda observação perturba a
realidade’ (isto é, ao observarmos a energia ela se transforma em partícula e
surge o mundo; quando não a observamos, tudo permanece como energia). E, apesar
disso, não estamos inclinados a conhecer as descobertas, da física moderna, que
exigem que reinterpretemos a própria ciência, o mundo e a nós mesmos. Em outras
palavras, não queremos conhecer e, desse modo, nos defender, daquilo que é a
origem de todas nossas ilusões, conflitos e sofrimentos. Preferimos enfiar a
cabeça na areia.
Conforme afirmam Heisenberg,
Einstein e Schroedinger, no íntimo da Realidade, observador e observado,
conhecedor e conhecido, não são separáveis. (não há separação; tudo é
interdependente, tudo é uma coisa só; bem e mal, belo e feio, saúde e doença,
isto é, todos os contrários, todos os postos inexistem na Realidade Final).
Krishnamurti: ‘o observador é a coisa observada’.
O dualismo (isto
é, divisão) primário (a percepção de eu e não-eu, eu e mundo, sujeito e objeto),
mostrou-se insustentável pela opinião da própria autoridade da física.
Bronowski: ‘A relatividade deriva da análise filosófica que insiste em que não
há um fato e um observador, mas uma junção dos dois numa observação; que o
evento e o observador são inseparáveis’. E Schroedinger, pai da mecânica
quântica: ‘O sujeito e o objeto são apenas um. Não se pode dizer que a barreira
entre eles caiu como resultado das recentes descobertas da ciência; essa
barreira nunca existiu’.
Pelas descobertas da
moderna física quântica, os novos físicos tiveram de abandonar o dualismo
ilusório de sujeito e objeto, onda e partícula, mente e corpo, espírito e
matéria e, com ajuda de Einstein, o de espaço e tempo, energia e matéria,
espaço e objetos. A nova física provou que tudo isso é ilusão. Como as costas e
a frente são apenas modos diferentes de ver um mesmo homem, nenhum modo sendo
mais real do que o outro, assim sujeito e objeto, psique e corpo físico,
energia e matéria, são apenas modos diferentes de ver a mesma realidade (a
mesma manifestação de energia, ou de Deus).
A mecânica
quântica foi um desastre para a física clássica porque destruiu a própria base
sobre a qual ela havia sido construída: o dualismo (separação, divisão) sujeito-objeto.
Até então, supunha-se que era real tudo que podia ser objetivamente observado e
medido. Mas, como a nova física exaustivamente provou, as realidades finais em
nenhuma circunstância podem ser precisamente observadas ou medidas. O simples
ato de observar modifica a realidade (isto é, quando observamos a energia se
transforma em partículas, em matéria). Sullivan: ‘Não podemos observar a
natureza sem perturbá-la’. Andrade: ‘Observar significa interferir naquilo que
estamos observando; a observação perturba a realidade’.
Whitehead: ‘Os
velhos alicerces da ciência se partiram e as bases estão ficando totalmente
incompreensíveis. Tempo, espaço, matéria, eletricidade, mecanismo, organismo,
estrutura, modelo, função, tudo requer re-interpretação’.
Broglie: ‘No dia
em que os ‘quanta’ (nome dado por Einstein, ao se comprovar a inexistência do
éter universal, aos ‘pacotes’ de energia, inclusive da luz do sol) foram apresentados,
o vasto e grandioso edifício da física clássica viu-se abalado nos próprios
alicerces. Na historia da ciência poucas mudanças comparáveis a esta se
registraram’.
D.T.Suzuki: ‘Em
sua natureza original, a consciência, tranqüila e pura (livre de
condicionamentos), está acima do dualismo sujeito e objeto’ (tudo é um).
William James:
‘Nossa consciência normal é apenas uma forma de consciência. Em toda sua volta,
separadas dela pelo mais fino véu, estão outras formas de consciência
inteiramente diversas. Podemos passar a vida inteira sem suspeitar-lhes a
existência; porém, aplique-se a elas o estímulo adequado e ei-las ali em toda
sua inteireza. Não pode ser completa nenhuma explicação do universo que não
considere essas outras formas de consciência. De qualquer modo, a percepção
delas nos leva a um antecipado acerto de contas com a realidade’ (Krishnamurti:
levam-nos à percepção daquilo que está após a morte biológica: um novo estado
de existir, um estado mais rico e mais real de existir).
As únicas
autoridades dignas de confiança com as quais podemos contar para conhecer
cientificamente esses procedimentos que podem nos levar à percepção da Verdade
Última são aquelas que perceberam os vários níveis da consciência, como o de
ser um ego e o de ir além do ego. Suas opiniões sobre a natureza da Mente, da
percepção mística, são impressionantemente idênticas e universais (é uma ‘experiência
de concordância universal’, segundo Einstein). Transcender o ego é um estado ou
nível de consciência infinitamente mais rico, mais natural e mais gratificante
do que podemos imaginar em nossos mais ousados vôos de fantasia.
Há duas opções de
julgar a verdade sobre a Mente: crer naqueles que a experimentaram, ou tentar
experimentá-la nós mesmos; se não fizermos nem uma coisa nem outra, devemos
evitar o julgamento de que isso é ilusão, alucinação ou doença mental.
As disciplinas
orientais, como o Vedanta e o Zen, não são teorias, filosofias, psicologias,
nem religiões; são um conjunto de experiências no sentido rigorosamente
científico do termo. Consistem de prescrições que, se seguidas à risca,
resultarão seguramente no descobrimento do Nível da Mente pura (isto é, daquilo
a que chamamos Deus). Recusar-se alguém a aceitar resultados de experimentos
científicos dessa natureza, porque não gosta dos métodos usados, é um gesto
profundamente anticientífico. Rejeitar um fato, ‘cuja prova experimental é
possível’, é absurdo, pois existe um caminho prescrito para os que desejarem
testá-lo. Quando falamos da percepção do Absoluto, não estamos falando de um
ponto de vista apenas teórico. Falamos de dados obtidos pela prática, pela
experiência, e o cientista que zomba de tais resultados, sem antes ter o
cuidado de realizar o experimento, não passa de um cientista no sentido mais
pobre do termo.
William James:
‘Todo o fluxo da minha educação convence-me de que o mundo de nossa consciência
ordinária é apenas um dos muitos mundos de consciência existentes, e de que
outros mundos hão de conter experiências que também têm significado para a
nossa vida; e de que, embora na maior parte das vezes suas experiências se
mantenham discretas, elas e as deste mundo se mostram interligadas em certos
pontos.’...‘O Nível da Mente pura é, de certo modo, mais real, mais básico e
mais significativo do que os outros. Essa experiência é tão total e
terrivelmente convincente que, quem a experimenta, sente que os outros níveis
de consciência (aqui incluído nosso nível comum de consciência) são irreais,
ilusórios e semelhantes a sonhos’.
Para os
incrédulos, a afirmação de que só o Nível da Mente é real, ou que é a única
vida verdadeira, o que significa que o nosso ego é uma ilusão, produz
estranheza total. Mas, todos os que investigaram esse nível (os místicos e,
hoje, cientistas quânticos) afirmam: o ‘eu’ é uma ilusão. E a essência de suas
revelações é: a realidade única e absoluta é a Mente pura. A Mente é o que é e
é tudo o que é, infinita, eterna.
.
‘O conhecedor, o conhecido
e o conhecimento são uma coisa só. As pessoas simples imaginam que Deus está lá
e elas aqui. Não é assim. Deus e eu somos um só no conhecimento’ (Eckhart,
místico cristão).
‘Eu vivo, mas não
sou eu quem vive; é o Cristo que vive em mim’. (Paulo).
‘O bem não
precisa adentrar a alma, pois já se encontra lá, embora não percebido por nós’.
(Teologia alemã).
‘Quando vemos
todas as coisas em sua unicidade, voltamos à origem e permanecemos onde sempre
estivemos’ (Sen T’Sen).
‘Por não saber quem somos, pois não temos
consciência de que Deus está dentro de nós, procedemos de maneiras geralmente
tolas, insensatas e até criminosas, e tão caracteristicamente humanas. Somos
salvos e libertados ao perceber o Deus, (‘Conhecereis a verdade e a verdade vos
libertará’) ate então despercebido, que já existe dentro de nós, e retornamos
ao nosso fundamento eterno e vemos que permanecemos onde sempre estivemos sem o
saber’.
‘Existe em nossa
alma algo que é mais glorioso, acima de tudo, disso e daquilo, do céu e da
terra. Ele é livre de todos os nomes e vazio de todas as formas. É uno e
simples, e nenhum homem, por mais sábio que seja, pode contemplá-lo’ (John
White).
‘O
desconhecimento de Deus é o cativeiro; o conhecimento de Deus é a liberdade e a
sabedoria’ (Evelyn Underhill). (‘A verdade vos libertará’).
‘Queres que te
mostre o que é Deus? Não acha paz aquele que de Deus está apartado’ (Santa
Catarina de Gênova).
‘Quando o amor de
Deus toca a alma, ele a encontra cheia de vícios e pecados; de início ele dá a
ela um instinto de virtude para incentivá-la à perfeição; depois,
infundindo-lhe graça, a leva à verdadeira auto-anulação (esquecimento do ego)
e, finalmente, à real transformação. Deus conduz a alma ao longo do caminho
(Paulo: ‘É o Senhor que opera em nós o pensar, o querer e o fazer’). Todavia,
quando a alma chega ao nada e é transformada, ela não trabalha, nem fala, nem
deseja, nem sente, nem ouve, nem compreende, nem tampouco nutre o sentimento do
dentro e do fora, onde pode se movimentar. Então, em todas as coisas, é Deus
que a governa e a conduz sem a mediação de nenhuma outra criatura. E o estado
dessa alma é então um sentimento de paz e tranqüilidade tão ilimitado que seu
coração e seu ser corpóreo, e tudo o que está dentro e fora, lhe parecem
imersos num oceano de serenidade, de onde ela jamais sairia para o que quer que
pudesse lhe acontecer na vida. E ela permanece imóvel, imperturbável,
impassível a tal ponto que lhe parece nada mais poder sentir além daquela mais
doce paz’ (Santa Catarina).
‘Quem sou eu?’ é
a eterna pergunta do homem. Essa busca de autocompreensão, do significado
último da personalidade, vem sendo respondida ao longo da história de várias
maneiras, todas apontando para uma experiência na qual o buscador e o objeto de
sua busca se fundem na percepção: ‘Eu sou Deus; não existe outro’ (Meher Baba).
(‘Sujeito e objeto são um’).
‘Você é a eterna
condição subjacente a todas as condições, que jamais nasceu e jamais morrerá, e
de onde provém toda a criação. A essência de toda a criação, Deus, está
exatamente dentro de você, de todos nós, quanto está dentro de tudo o mais’
(Baba).
‘Não que você
esteja exatamente dentro do cosmos – o cosmos é que está exatamente dentro de
você’ (Baba).
‘A busca é provocada pela ânsia de
felicidade do homem e de sua procura de um meio de escapar da armadilha que é a
vida.
Não é sua culpa se ele supõe que a solução para a sua
profunda insatisfação reside numa vida sensual ou nas realizações profissionais
ou do mundo social, ou ainda em uma vida de experiências excitantes. Tampouco é
culpa sua se a vida, em geral, não é bastante longa para ensinar-lhe,
concretamente, que ele encontraria uma desilusão ainda maior e mais profunda se
esses objetivos fossem satisfeitos por completo.
O homem é impelido a essa busca pela desilusão (desencanto) com
as coisas mundanas que o fascinam e das quais não consegue afastar o
pensamento. Empenha-se o quanto pode em alcançar os prazeres dos sentidos e em
evitar todos os tipos de sofrimento.
Mas, enquanto ele
atravessa dias, meses e anos das mais variadas experiências, surge, com
freqüência, uma ocasião em que ele começa a questionar: ‘Qual a finalidade de
tudo isso?’ E, incapaz de se contentar com as coisas transitórias da vida,
questionando, ele se torna totalmente cético em relação aos valores habituais
que até então aceitava sem hesitação.
E, nesse desespero, o homem toma a decisão de descobrir e
compreender o propósito da vida. É então que ele principia a verdadeira busca,
a busca dos prazeres duradouros (Baba).
‘Aqui está você,
sentado nesta sala, me ouvindo e pensando que sua presença aqui é real. Mas eu
lhe garanto, você está apenas sonhando. Suponha que esta noite você sonhe que
está sentado aqui e, no sonho, alguém lhe diga que você está apenas sonhando.
Você retrucará: ‘Não estou sonhando; estou realmente tendo a experiência de
estar sentado aqui, ouvindo a palestra de Baba com todas as pessoas que me
cercam!’ Mas, pela manhã você acorda e vê, então, que tudo foi um sonho. Pois,
lhe afirmo, um dia também você ‘acordará’ e terá certeza de que tudo o que você
sempre fez não passou de um sonho. Eu sou Deus, assim como cada um de vocês
também é Deus. Mas, enquanto eu já acordei, vocês continuam ainda dormindo e
enredados em seus sonhos. Despertar do sonho da separatividade e da limitação
auto-imposta é o caminho místico, da libertação, do encontro com Deus’. (Baba).
‘Existe uma só
pergunta: ‘Quem sou eu?’ e, para essa pergunta só existe uma resposta: ‘Eu sou
Deus!’ E quando você conhecer a resposta a essa pergunta, não há mais nada a
perguntar (‘...a verdade vos libertará’). O problema é que as pessoas não sabem
quem realmente são. Você é o infinito, você está de fato em toda parte; mas
você acha que é o corpo, os sentidos, a memória e, por isso, se acha limitado.
Se você olhar para dentro de seu íntimo e vivenciar sua própria alma em sua
verdadeira natureza, você perceberá que
é infinito e eterno e que está além de toda criação’ (Baba).
‘Finda a busca, todas as dificuldades são ofuscadas pela
recompensa final. Os grilhões da individualidade limitada se rompem; o mundo
das sombras (ignorância) chega ao fim; o véu da ilusão (ego) é removido para
sempre. A agitação e a angústia torturante das buscas da consciência limitada
(do ego) são substituídas pela tranqüilidade e beatitude da consciência
ilimitada da Verdade. A inquietação, o frenesi e o sofrimento da existência
mundana são tragados pela paz da bem-aventurança e da eternidade’ (Baba) (Buda:
‘A iluminação é o fim de todo sofrimento’).
‘A experiência
espiritual (mística) vai muito além do q pode ser apreendido pelo intelecto,
imaginação, raciocínio, pensamento. O misticismo costuma ser considerado como
algo antiintelectual, obscuro e confuso e até patologia ou impraticável e sem
relação com a experiência, mas, na verdade, nada tem a ver com essas idéias.
Nada existe de irracional no misticismo verdadeiro, quando ele é como deve ser:
uma visão ou comunhão com a Realidade. É uma visão absolutamente clara, e tão
prática que pode ser vivida em cada momento da vida e expressar-se em todas as
tarefas do dia-a-dia. Ele é a compreensão final de todas as experiências’
(Baba).
‘Para a busca não
é necessário ter um mapa completo do caminho para iniciar a viagem. Ao
contrário, a insistência em ter esse conhecimento completo pode dificultar em
vez de facilitar o caminho. Os segredos mais escondidos são revelados àqueles
que correm riscos e fazem experiências ousadas com ele. Não se destinam ao
ocioso que busca garantias a cada passo. Quem especula, na praia, sobre o
oceano conhece apenas sua superfície, mas quem deseja conhecer suas profundezas
precisa estar disposto a mergulhar nele’ (Baba).
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ILUMINAÇÃO 2 –
Outros testemunhos
Sri Aurobindo:
Foi caminhando no pátio da prisão onde, por ter sido, por engano, confundido
com um terrorista, esteve por certo tempo, que ele sentiu uma mudança de
consciência: ‘Contemplei a prisão que me separava dos homens, e já não estava
aprisionado por seus altos muros: era Vasudeva (Deus) que me cercava. Caminhei
sob os ramos da árvore diante de minha cela, mas ela já não era mais a árvore.
Eu sabia que era Krishna (Deus) que eu via ali, estendendo-me sua sombra. Olhei
para a grade de minha cela e novamente vi que a grade era Deus. Era Deus que me
guardava na figura da sentinela. Deitei sobre os cobertores ordinários q me
serviam de cama e senti que me aconchegava nos braços de Deus. Olhei para os
prisioneiros, os assassinos de todas as espécies e vi que era Deus que eu
encontrava naquelas almas entristecidas e naqueles corpos maltratados. Quando
fui a julgamento, com cerca de 200 testemunhas, já não via a turba hostil nem
os juízes, mas eu não os via senão como Vasudeva, risonho. Tudo era Deus, que
se tornou o próprio mundo.
Assim dizem os Upanishades: ‘Ele está em todas as coisas e
comanda todos os atos (Paulo: ‘É o Senhor q opera em nós o pensar, o querer e o
fazer’). Ele se tornou conhecimento e ignorância, verdade e falsidade, bem e
mal. Ele se tornou tudo que existe. Para o olho que ‘vê’, tudo é Um, tudo é
Vasudeva’.
‘Este mundo em
que vivemos é um mundo de luta e labor, um mundo feroz, perigoso, destrutivo,
devorador, no qual, a cada passo, queiramos ou não, algo é esmagado e
destruído; no qual cada sopro de vida é também um sopro de morte. Colocar a
responsabilidade de tudo que nos parece mau ou terrível nos ombros de um
demônio semi-impotente, ou deixá-la de lado, como sendo parte da natureza,
criando uma oposição intransponível entre a natureza do mundo e a natureza de
Deus, como se a natureza fosse independente de Deus, ou ainda lançar a
responsabilidade sobre os homens e seus pecados, como se o homem tivesse voz
ativa na criação deste mundo ou pudesse criar algo contra a vontade de Deus,
tudo isso constitui estratagemas, artifícios cômodos... Erigimos, criamos,
imaginamos um Deus de amor e misericórdia, justo, probo e virtuoso de acordo
com as nossas concepções morais de justiça, virtude e retidão e, a todo o resto
dizemos ‘Não é Ele’ ou ‘Não é dele’, ‘não foi Deus quem fez isso’ etc., mas que
foi criado por um ser diabólico a quem, por um motivo qualquer, Ele permite
cumprir sua vontade perversa e funesta; ou então foi culpa do homem egoísta e
pecador, que estragou, pelo mau uso de seu livre-arbítrio, aquilo que foi
criado originalmente perfeito. Temos de encarar corajosamente a realidade e
perceber que foi Deus, e ninguém mais, que criou este mundo em seu próprio ser
(Paulo: ‘Em Deus vivemos e respiramos; Ele está acima e abaixo, à frente e
atrás, à direita e à esquerda, fora e dentro de nós’) e o fez como ele é. Temos
que ver que a Natureza devorando seus filhos, o Tempo consumindo as vidas das criaturas,
a Morte universal e inelutável e as violências no homem e na natureza são
também o supremo Ser Divino em uma de suas representações cósmicas. Temos
também de perceber que o Deus generoso, amoroso, o criador e conservador
prestimoso, forte e benévolo é também o Deus devorador e destruidor. O
sofrimento, a dor e o mal com que somos torturados é também seu toque tanto
quanto a felicidade, a suavidade e o prazer. Só quando vemos com a visão de
completa união e sentimos essa verdade no âmago de nosso ser é que podemos
descobrir totalmente, por trás dessa máscara, o rosto sereno e formoso da
Divindade bem-aventurada.
As discórdias do
mundo são as discórdias de Deus, são a vontade de Deus, e só aceitando-as e
superando-as podemos ascender à concórdia maior de sua suprema harmonia, à
vastidão, à imensidade transcendente. Porque a Verdade é o alicerce da
verdadeira espiritualidade e coragem da alma’ (Aurobindo).
‘Tu és Ele’, eis
a verdade eterna. ‘Tu és Isto’, ‘Eu sou Aquilo’, ‘Eu sou Ele’, ‘Não conheço
nenhum Deus senão meu próprio Eu’, ‘Conhece-te a ti mesmo e serás Deus’, eis as
verdades que todos os antigos mistérios ensinavam e que, as religiões q vieram
depois, se esqueceram de ensinar. Assim, também, ‘Eu e o Pai somos Um’.
Jesus, o Cristo,
também disse ‘Este é meu corpo e este é meu sangue’ escolhendo esses dois
símbolos mais materiais, mais triviais e terrenos do pão e do vinho para
comunicar a idéia de que tudo é um corpo só, o corpo do divino? (Aurobindo).
‘Quando Isto é conhecido,
Tudo é conhecido’ (Upanishades).
Roger N. Walsh:
‘O grande psicólogo Gordon Alportt lamentava-se: ‘Nada temos na psicologia
acerca da libertação’. Ele lastimava o fato de a psicologia clinica e a
psiquiatria ocidentais serem essencialmente voltadas para a patologia e terem
poucos conhecimentos da saúde psicológica e, muito menos, da ‘iluminação’.
Esses temas são bastante mal compreendidos. Muitos profissionais da saúde
mental ainda consideram fenômenos como a maturação psicológica além das normas
culturais, as experiências místicas e a iluminação como lendas na melhor das
hipóteses, e patológicas, na pior ‘regressão psicológica no caso mais extremo,
como descreve um conhecido tratado de psicologia.
‘Prazer e dor,
louvor e censura, fama e vergonha, perda e ganho, mal e bem, são a mesma coisa.
Assim eu e você’ (Buda).
‘Todos os Budas e
todos os seres sencientes nada mais são do que Mente Universal. Acima e abaixo,
fora e dentro de você, tudo existe espontaneamente, pois nada existe fora da
Mente Buda’ (Zen).
‘Vê esse sereno
homem do Tão, que abandona o aprendizado e não se empenha? Ele nem evita falsos
pensamentos, nem busca a verdade, pois, na verdade, o ‘desconhecimento’ é a
natureza búdica, e este corpo ilusório e mutável é o corpo da Verdade’ (Zen).
O poeta americano
Walt Whitman é um daqueles que tiveram vislumbres dessa experiência, daquilo
que chamamos iluminação ou consciência cósmica. Ele, como outros que tiveram a
mesma experiência, afirmou que ninguém conhece a verdade pelo fato de
freqüentar templos e cultos, nem por ouvir sermões que emocionam, nem por pedir
aos céus, ou por orar; nem por promessas ou por praticar as virtudes pregadas
pelas diferentes igrejas e crenças, ou por sacrifícios.
Como os místicos e
os iluminados, ele afirma que, somente na solidão, no silêncio do “eu”, na perseverança da busca, é que nós podemos
encontrar aquilo que é sagrado. E, depois disso, vamos perceber que sermões,
escrituras, sacrifícios, rituais, cultos, orações, promessas, isto é,
exterioridades, não têm qualquer valor; desaparecem como fumaça.
E afirmou,
também, que: “Enquanto estamos na escuridão, não compreendemos as escrituras;
quando chegamos à luz, elas não são mais necessárias”.
Pascal, conhecido
matemático, cientista e escritor francês:
A partir de certo
dia, ele se afastou da sociedade e se tornou recluso em sua própria casa (como
Jesus, nas chamadas tentações, no deserto; Paulo, que foi viver entre tecelões,
depois de sua visão na estrada de Damasco, e outros que, depois da experiência,
se retiraram para, na solidão, tentar compreender o que lhes havia ocorrido).
Depois de certo
tempo, Pascal recomeçou a escrever, mas suas obras, agora, tinham um caráter
mais elevado, diferente das anteriores. Sua compreensão de vida e de mundo
tinha se modificado de maneira drástica. Quando morreu, um criado encontrou,
costurado com cuidado dentro da bainha de seu gibão (túnica), um pergaminho
onde estavam escritas as seguintes palavras:
“Ano da graça de
1654, segunda-feira, 23 de novembro... desde cerca das dez e meia da noite até
meia-noite e meia... FOGO, FOGO... transfiguração... Deus de Abraão, Deus de
Isaac, Deus de Jacob... Certeza, alegria, certeza, sentimento de alegria e
paz... Deus de Jesus Cristo, meu Deus e teu Deus... Esqueci-me do mundo e de tudo, exceto de Deus. Ele só é
encontrado nos caminhos dos Evangelhos... a GRANDEZA DA ALMA HUMANA... agora
vejo que ela é o próprio Deus. Pai justo, o mundo não te conhece, mas eu te
conheci. Alegria, alegria, alegria, lágrimas de alegria! Eu não me separarei
jamais de ti... Meu Deus, esta é a vida eterna que se ganha depois de te
conhecer, o único Deus verdadeiro, e aquele que tu enviaste - o Cristo; com
ele, tudo é Um... Renúncia total e doce... submissão total a Cristo...
eternamente em alegria por um momento de aprendizado sobre a terra... jamais
esquecerei o que hoje me ensinaste... Amém”.
Esse pergaminho
existe até hoje. Recebeu o nome de “amuleto místico de Pascal” e está na
Biblioteca Nacional, em Paris.
Edward Carpenter:
‘... Acabados todos os sofrimentos, acabadas todas as penas... abriu-se dentro
de mim um profundo oceano de felicidade... todas as coisas foram
transfiguradas, cantando felicidade sem fim... Naquele dia, no dia da tua
libertação, ela virá a ti em lugar que desconheces, sem que saibas em que tempo
(como na parábola do ladrão)... tu, então, estarás livre para sempre... (“... a
verdade vos libertará”); deixa que a felicidade te invada... a morte já não te
separará daqueles a quem amas... o mundo da igualdade... da felicidade total...’.
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