terça-feira, 1 de março de 2011

NÃO SÃO AS OBRAS QUE LIBERTAM.

Amigos,

“Um jovem evangélico me disse, maravilhado, ter aprendido com o Pastor de sua comunidade que, conforme Tiago, "a fé sem obras é morta"...”.

Comentário: frente a essa afirmação, qual será o significado destas palavras de Paulo: “Não sois salvos por vossas obras, mas pela graça de Deus”?

É evidente que, como o amigo colocou, fé, caridade e obras (embora o mais significativo aí sejam as obras que se confundem com caridade, já que esta se confunde com amor) são importantíssimas para o homem, em particular em sua vida de relacionamento com o próximo. A fé é bom tê-la pois nos dá esperanças de um futuro de recompensas e felicidade; só isso.

Se nos despirmos de todo e qualquer preconceito, e fizermos uma profunda análise, vamos ver que sempre foi esse o objetivo dos Mestres, de cujas palavras nasceram religiões: conseguir um mais harmonioso relacionamento entre os homens, sempre e inevitavelmente, levados, pela vida, a tantos infortúnios e adversidades. Observem os mandamentos “recebidos” por Moisés e adotados pelo cristianismo, em suas diferentes doutrinas: não matar, não roubar, não cobiçar o que seja do próximo, não desonrar, não dar falso testemunho, não adulterar.

Observe que aí nada tem que signifique regra de “salvação”. Quanto aos três ou quatro primeiros são inócuos, pois apenas visam a que se respeite aquele ser poderoso que o homem tão somente “imagina” o que possa ser. E não só que se respeite, mas até que se tema, como ainda hoje ocorre com tantas ameaças que as religiões, não só as ocidentais, apregoam.

Veja o que todos os líderes, depois tidos por líderes religiosos, tiveram que fazer inicialmente: colocar ordem e tranqüilidade no povo. Esse é o exemplo de Moisés, liderando uma fuga pelo deserto de, fora as crianças, 600 mil pessoas, rebeldes, sofridas, desorganizadas, indisciplinadas, prontas para matar, roubar, cobiçar etc. Como esse povo o obedeceria, quando não tinha recurso algum, nem mesmo para transmitir suas ordens para que suas instruções fossem seguidas por aquela multidão desorganizada e nervosa, depois de tantos anos de escravidão? Somente despertando-lhe medo, o que fez apresentando-lhe um “Deus poderoso e cruel”, com ordens que, se negligenciadas pelo povo pagão, resultariam castigos terríveis e assustadores, como ocorreu tantas vezes. O mesmo fez Maomé, com seu povo.

Observe e verá que, ainda hoje, aquele medo persiste. Essa a razão de confissões e comunhões, promessas, sacrifícios, forçar a própria natureza para perdoar, para agir com amor ao próximo, penitências, orações etc. Como não podemos deixar de perceber, é o medo que está por trás de tudo isso; medo de não estar protegido, de não agradar ou de ofender a divindade; de não cumprir os mandamentos de sua crença e vir a ser, em conseqüência, sentenciado a penalidades torturantes e cruéis, ditas educativas.

O medo dos ancestrais ainda está em nós. E a crença de que agradando Deus seremos favorecidos, também. Quanta coisa o homem faz para agradar e, assim, conseguir o favor de Deus? Promessas de fazer ou não fazer; sacrifícios vários do próprio corpo, orações, serviços/caridade forçados ao próximo etc.

Quantas vezes a natureza do indivíduo ainda não tem condições de amar, mas ele a força, pois que acredita que deve seguir os conselhos de sua crença particular e que, assim, conseguirá méritos. Por isso, os sábios dizem que, enquanto não se “conhecer a verdade que liberta”, como disse Jesus, todas as virtudes são ou prematuras, imitações, forçadas ou falsas. O homem, muito do que faz quando parece virtuoso, o faz por receio da desaprovação de Deus. A expressão comum “sou temente a Deus” é significativa.

As lições de Jesus, em geral, tinham o mesmo objetivo: uma vida menos sofrida alicerçada no fato de todos se respeitarem naqueles aspectos citados; quando o Mestre disse “... dali não sairás até que tenhas pago o último ceitil...”, “... serás atirado ao fogo da geena...”, “... teu credor te levará ao juiz...”, “oferece a outra face”, “perdoai sempre”, observe que tudo visava a um relacionamento mais harmonioso com vistas a suavizar a vida daqueles homens já sujeitos a tantas desditas.

Isso é a religião popular, organizada: leva os homens a melhor se conduzirem e se respeitarem, sobretudo por temerem as conseqüências, tantas vezes inenarráveis, de seus “erros”. Por isso, muitos e sérios pesquisadores do cristianismo primitivo afirmaram que “‘pelo cristianismo de hoje, ninguém chega ao Pai”, que “a igreja cristã falhou, por estar fazendo a humanidade ocidental caminhar contra um muro, sem conseguir dar um passo na direção de Deus”.

As ameaças de inferno, umbral, castigos terríveis, encarnações multiplicadas ou dolorosas, produzem medo e despertam, em muitos, o esforço para praticar as “obras sem as quais a fé é coisa morta”.

Paulo afirmou, também: “É o Senhor que opera em nós o pensar, o querer e o fazer”; não estará aí a justificativa para “Não somos salvos pelas nossas obras...”?

Se é o Senhor que opera “nosso pensar, nosso querer e nosso fazer” como podemos ser culpados por “obras nossas”? Por isso, somos “salvos pela graça de Deus” e não por nossas obras que, na verdade, segundo Paulo, não são nossas.

Observa-se, assim, que também as quatro regras citadas pela DE, relativas às boas obras, à caridade visam o mesmo objetivo: uma vida menos infeliz conquistada graças a um melhor relacionamento entre os homens. Não há regras de “salvação”; estas, entre outras, estão nas palavras de Jesus: “Buscai em primeiro lugar o reino de Deus...” e em “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, palavras que, podemos supor, muitos homens da época, e mesmo de hoje, nem mesmo alcançavam seu significado. Por aí vemos que é a "verdade que liberta"; não, as obras.

Abraços.

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