Amigos
Cito pergunta de um companheiro:
“No universo somente há um criador que causa todos os acontecimentos... E os homens buscam culpados para todos os males. Mas, pode alguém ser culpado de alguma coisa, se Deus é a causa de tudo?”
Resposta:
É isso, meu amigo; as religiões populares, organizadas (não as “religiões” profundas) incutiram nos seus seguidores, desde que elas e eles nasceram, a idéia de um Deus, criador de todas as coisas, todo poderoso, de infinito amor e justiça etc, mas que, ao mesmo tempo, é um vingador (“A vingança cabe ao Senhor”) que maneja um chicote sob cujas chibatadas todos nós, sem exceção de ninguém,
Embora nem as religiões, nem seus seguidores admitam tais conceituações (a de que Deus nos faz
As doutrinas trazem a idéia insustentável de que Todo Poderoso criou apenas muita coisa, mas não todas; que Deus criou o belo, a beleza, o bem, a alegria, a felicidade, tudo que nos é agradável ou inspirador, que nos eleva o ânimo e a esperança; mas que Deus não criou a feiúra, o mal, a tristeza, a infelicidade, tudo o que é desagradável ou deprimente etc. Tudo que é no sentido do bem é criado por Deus: tudo que é no sentido do mal, é criado pelo único agente ativo restante, a criatura procedente de Deus. Dentro da visão equivocada de que este mundo em que vivemos é um “mundo de provas e expiações”, aceitam a idéia de que o mal e a dor são necessários para limpar nossas imperfeições, cuja origem “desconhecemos” pois, pela concepção das religiões, todos somos criados com uma única imperfeição: a ignorância; aceitam a idéia de que, com o decorrer do tempo, nos tornamos portadores de um número enorme de outras imperfeições, das mais “inocentes” às mais absurdas e hediondas, como podemos observar no mundo.
Religiões e seguidores admitem a idéia de que Deus permite todo o mal e sofrimento e desgraças e tragédias; mas que Ele
Todos admitem o amor, a bondade, a beleza, a felicidade, mas se esquecem de que o mundo em que vivemos é um mundo feroz, perigoso, destrutivo, devorador, no qual, a todo instante, queiramos ou não, algum ser é esmagado e destruído; no qual cada sinal de vida é também um sinal de morte. Colocar a responsabilidade de tudo que nos parece mau ou terrível nos ombros de um demônio semi-impotente, já passou de moda, pois esse saiu de cena; ou deixar o mal de lado, como sendo parte da natureza, criando um abismo entre a natureza do mundo e a natureza de Deus, como se a natureza fosse independente ou nada tivesse a ver com Deus; ou ainda lançar a responsabilidade sobre os homens e seus pecados, como se o homem tivesse voz ativa na criação deste mundo ou pudesse criar algo contra a vontade de Deus, tudo isso constitui argumentações cômodas, mas que nada explicam.
Imaginamos e criamos um Deus de amor e misericórdia, justo, probo e virtuoso de acordo com as nossas concepções de justiça, virtude e retidão. E, a tudo que não se harmoniza com o Deus que criamos, dizemos “isso não foi Ele que criou”, “isso não é Dele”, “‘não foi Deus quem fez isso” etc., e imaginamos, como algumas crenças o fazem, que tudo que é errado foi criado por um ser diabólico a quem, por um motivo desconhecido, Ele permite cumprir sua vontade perversa; ou então que foi culpa do homem egoísta e orgulhoso, que estragou tudo aquilo que foi criado originalmente perfeito.
Por medo, preconceitos e condicionamentos, não conseguimos encarar a realidade de que é Deus, e ninguém mais, o criador deste mundo em seu próprio ser (Paulo: “Em Deus vivemos e respiramos; Ele está acima e abaixo, à frente e atrás, à direita e à esquerda, fora e dentro de nós e de tudo”) e de que Deus o fez como ele é. Temos que ver que a natureza devorando seus filhos, o tempo consumindo as vidas das criaturas, a morte universal e inevitável e as violências e dores que o homem sofre são também o supremo Ser Divino em uma de suas “representações cósmicas”. Temos também de perceber que o Deus generoso, amoroso, o conservador prestimoso, forte e benévolo é, também, o Deus devorador e destruidor (hinduísmo: Brahma, Shiva, Vichnu, o criador, o mantenedor, o destruidor). O sofrimento, a dor e o mal com que somos torturados, durante toda vida, são também seu toque tanto quanto a felicidade, a suavidade e o prazer.
Só quando vemos com a visão libertada de todas as ilusões e de “união” e sentimos essa verdade (“... a Verdade vos libertará”) no âmago de nosso ser, é que podemos descobrir totalmente, por trás do véu das ilusões com que o ego cobre nossa visão, o rosto sereno e repleto de luz da Divindade bem-aventurada. As discórdias do mundo são as discórdias de Deus, são a vontade de Deus (ou de quem mais seriam?), e só aceitando-as e superando-as podemos compreender e chegar à Sua suprema harmonia, à vastidão, à imensidade transcendente, à sabedoria, ao amor, à bem-aventurança. Precisamos compreender que a Verdade (e não o esquivar-se da verdade, por preconceitos tolos ou medos) é a base da verdadeira espiritualidade (“Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”).
Fiquem em Deus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário