quinta-feira, 29 de março de 2012

EU SOU AQUILO

 .(36) “EU SOU AQUILO”  -   (Do livro ‘I AM THAT’, de Shri Nisargadatta Maharaj)
                    
   (Q=pergunta; NM=resposta de Nisargadatta)


“Quando se atinge a iluminação, a visão total atingida é tão clara que o indivíduo não faz mais do que rir e até, em aparência, ser
irreverente, quando vê a fantástica superestrutura de superstições, ilusões e mistérios que está erigida (pelas nossas crenças e religiões, tradições, costumes e cultura, suposições e sociedade) sobre e em torno da simplicidade elementar que é a Verdade".

"Quando você está interessado na verdade, na realidade, você deve questionar todas as coisas, mesmo sua própria vida. Ao crer na necessidade de uma experiência sensorial e intelectual emocionante, você limita sua investigação à busca de satisfação e de conforto.” (E não vai à busca da Verdade).

“Enquanto houver um corpo e uma mente para proteger o corpo,
existirão atrações e repulsões (devidos às limitações da mente individual em face de suas ilusões, suposições, crenças, cultura etc.). Existirão no campo dos fatos, mas não devem trazer preocupação para aquele que está compreendendo. O foco de sua atenção estará em outro lugar (além da mente). Não estará distraído”.

"Este que vê o tudo isto e também vê o nada, é o mestre interior (aquilo a que damos o nome de Deus). Só ele é; todo o restante parece ser. Ele é seu próprio ser, sua esperança e segurança de liberdade: encontre-o e una-se a ele (isto é, perceba-o), e estará a salvo e seguro” (‘... a Verdade vos libertará’).

“A Libertação não é uma aquisição, mas uma questão de coragem; coragem de aceitar que você já é livre e de agir com base nisso”.

Q: Mas pensar, racionalizar não é o estado normal da mente? A mente pode parar de trabalhar, de funcionar?

NM: Pode ser o seu estado habitual, mas isso será sempre o seu estado normal? Um estado normal não é doloroso enquanto que o habitual quase sempre leva à dor e ao sofrimento.
Q: Se esse não é o estado natural ou normal da mente, como cessá-lo? Deve haver uma forma de aquietar a mente. Quantas vezes digo a mim mesmo: ‘por favor, pára, chega deste falatório sem fim, de frases repetidas vezes sem conta!’ Mas a minha mente não pára. Sinto que é possível pará-la um pouco, mas não por muito tempo. Até mesmo os assim chamados "espirituais" usam artimanhas para manter as suas mentes quietas. Eles repetem fórmulas, cantam, rezam, fazem respiração forçada ou suave, giram, concentram-se, meditam, buscam transes, cultivam virtudes - trabalham o tempo todo de forma a pararem de trabalhar, pararem de procurar, pararem de se mover (para que a mente pare de operar). Quando isso não é trágico, é ridículo.

NM: A mente existe em dois estados: enquanto água e enquanto mel. A água vibra ao mínimo distúrbio enquanto que o mel, embora perturbado, retorna rapidamente à imobilidade.

Q: Pela sua natureza a mente é agitada. Talvez ela possa ser aquietada, mas não é quieta por si mesma, não é isso?

N.M.: Quando tens febre, tremes a toda a hora. São os desejos e os medos (a febre) que fazem a mente inquieta (trêmula). Livre de todas essas emoções a mente fica quieta.

Q: Sim, às vezes sinto isso. Mas sempre que a sensação de perigo se instala, eu me sinto isolado, à parte de todas as relações com os outros. Você entende? É aqui que está a diferença entre as nossas mentalidades. Na mentalidade hindu, a emoção segue o pensamento. Dê a um hindu uma idéia e as suas emoções afloram. Com um ocidental é o oposto: dê-lhe uma emoção e ele irá produzir muitas idéias. As suas idéias são muito atrativas intelectualmente, mas emocionalmente não.

NM: Coloca o teu intelecto à parte. Não o uses nestes assuntos.
(isto é, esqueça o ‘eu’).

Q.: De que serve um conselho se não podemos lhe dar continuidade (se não podemos aplicá-lo corretamente)? Tudo isto são idéias e você quer que eu não responda emotivamente às idéias. Sem emoção, como pode haver ação?

NM: Por que falas em ação? Alguma vez ages por conta própria? Algum poder desconhecido age e tu imaginas que és tu que estás a agir. Tu estás meramente a ver o que acontece sem poderes influenciar em nada (és apenas testemunha).

Q: Por que há uma resistência tão grande em mim para a aceitação de que não posso fazer nada, de que não decido nem escolho?

NM: Mas, que podes tu fazer? Tu és como um paciente sob anestesia no qual o cirurgião faz uma cirurgia. Quando acordas vês que a operação terminou; podes dizer que fizeste alguma coisa?

Q: Mas fui eu que escolhi submeter-me à cirurgia.

NM: Claro que não. Foi a tua doença, por um lado, e a pressão do teu médico e da família, por outro, que te fizeram, aparentemente, decidir. Não tens escolha alguma; apenas a ilusão de que escolhes, de que tu decides; não há escolha.

Q: No entanto, não me sinto tão indefeso quanto você faz parecer. Sinto que posso fazer tudo aquilo que penso; só não sei como fazer. Não é o poder que me falta, é o conhecimento.

NM: Não conhecer os meios para fazer é admitido como sendo tão mau quanto não ter o poder! Mas deixemos este assunto por agora; afinal, não é importante o motivo pelo qual nos sentimos indefesos, mas sim que consigamos ver claramente que neste momento somos indefesos.

Eu tenho agora 74 anos e, no entanto, me sinto como se fosse uma criança. Eu sinto claramente que apesar de todas as mudanças eu sou uma criança. O meu Guru disse-me: essa criança, que és tu neste exato momento, é o teu verdadeiro eu. Volta a esse estado de puro ser, onde o "Eu sou" ainda está na sua pureza antes de ter sido contaminado e confundido com "eu sou isto" ou "eu sou aquilo". O teu fardo (os teus problemas) é de falsas identificações - abandona-as todas. O meu Guru disse: "Confia em mim. Eu te digo: tu és divino. Toma isto como verdade absoluta. A tua alegria é divina, o teu sofrimento também é divino. Tudo vem de Deus. Lembra-te sempre: Tu és Deus, e sempre é feita a tua vontade." Eu acreditei nele e rapidamente realizei o quão as suas palavras eram verdadeiras e certas. Não condicionei a minha mente pensando: "Eu sou Deus, eu sou maravilhoso, eu estou além." Simplesmente segui a sua instrução que era focar a mente no puro "Eu sou" e ficar aí. Eu costumava sentar-me durante horas seguidas com nada exceto o "Eu sou" na minha mente e, cedo, a paz e a alegria e um amor profundo e envolvente tornaram-se o meu estado normal. Nisso, tudo desapareceu - eu, o meu Guru, a vida que vivia, o mundo à minha volta. Apenas a paz se manteve envolta por um silêncio incompreensível.

Q: Parece tudo muito simples e fácil, mas não é. Às vezes acontece o maravilhoso estado de alegria e eu olho e penso: quão facilmente vem e quão parece íntimo e totalmente meu. Onde estava a necessidade de lutar tão fortemente por este estado que é tão próximo? Mas cedo esse estado se dissolve e deixa-me a pensar se teria sido realidade ou alguma ilusão. Se era realidade, por que se foi embora? Talvez seja necessária alguma experiência singular para se ficar nesse novo estado para sempre e, até que essa experiência crucial aconteça, este jogo de esconde-esconde vai continuando.

NM: A tua expectativa de algo singular e dramático, de alguma explosão maravilhosa, está apenas a atrasar (é apenas obstáculo) a tua realização. Não é para esperares uma explosão, pois a explosão (esse milagre) já aconteceu - no momento do teu nascimento, quando te realizaste como sendo ser-conhecimento-sensação. Há apenas um erro que estás a fazer: tu tomas o dentro como sendo o fora e o fora como sendo o dentro. O que está em ti, tu tomas como estando fora de ti, e, o que está fora, tu tomas como estando dentro de ti (isto é, a tua interpretação sempre incorreta das coisas do mundo). A mente e os sentimentos são externos, mas tu os tomas como internos, íntimos. Tu acreditas que o mundo é objetivo, mas ele é inteiramente uma projeção da tua psique. Essa é a confusão básica e nenhuma explosão a vai esclarecer. Tens de te pensar fora disso. Não há outra forma.

Q: Como é que eu vou me pensar desse modo se meus pensamentos vêm e vão conforme querem? (os pensamentos vêm e não são nossos, porque a escolha e a decisão também não são nossas). O falatório interminável dos pensamentos (o filme emotivo-imaginativo) me distrai e me deixa exausto, na tentativa de controlá-lo.

NM: Observa os teus pensamentos assim como observas o movimento na rua, como observas as nuvens flutuando no céu. As pessoas vêm e vão; registra isso sem resposta (sem qualquer reação). Pode não ser fácil no início, mas, com alguma prática, irás descobrir que a tua mente pode funcionar em vários níveis ao mesmo tempo e que podes estar ciente de todos eles. Apenas quando tens um forte interesse num nível específico é que a tua atenção é aprisionada nele e os outros níveis te são ocultos. Neste caso, o trabalho nos níveis barrados continua fora do campo consciente. Não lutes com as memórias e pensamentos; tenta apenas incluir no teu nível de atenção outras questões mais importantes como "Quem sou eu? Como é que nasci? De onde vem este Universo à minha volta? O que é real e o que é falso?" Nenhuma memória irá persistir se perderes interesse nela; ela é a ligação emocional que perpetua o laço (com tudo que está a acontecer; não te esqueças que és apenas testemunha; não  adianta tentares interferir).

Estás sempre à procura de prazer, evitando a dor, sempre atrás da felicidade e da paz. Não vês que é essa mesma busca por felicidade que te faz sentir infeliz? Tenta de outro jeito: indiferente à dor e ao prazer, sem perguntar, sem recusar, dá toda a tua atenção ao nível no qual "Eu sou" está eternamente presente. Em breve irás perceber que a paz e a felicidade são a tua própria natureza; é apenas quando as procuras por canais específicos que elas são perturbadas. Evita essa perturbação; isso é tudo. Não há necessidade de procurar; não há necessidade de procurar aquilo que já tens (aquilo que já és). Tu és Deus, a Realidade Suprema. Para começar, confia em mim, em minhas palavras. Isso permite que tu dês o primeiro passo - e então a tua confiança será justificada através da tua experiência. Em cada caminhada na vida, confiança inicial é essencial; sem isso, pouco pode ser feito. Cada passo é um ato de fé.

Até o pão diário tu comes confiando! Lembrando-te do que te disse: tu conseguirás tudo. Digo-te outra vez: Tu és a realidade que em tudo está e que a tudo transcende. Age de acordo com isso: pensa, sente e age em harmonia com o todo e a confirmação da experiência do que eu digo irá florescer em ti brevemente. Nenhum esforço é necessário. Tem fé e age a partir daí. Nada quero de ti. É no teu interesse que te falo porque, acima de tudo, tu te amas a ti mesmo, tu te queres seguro e feliz. Não tenhas vergonha disso; não o negues. É natural e bom que nos amemos a nós mesmos. Apenas deves saber o que realmente amas. Não é o corpo que amas, é a Vida - sentindo, pensando, fazendo, amando, lutando, criando. É a Vida que amas, a vida que és tu mesmo e que é tudo. Perceba isso na sua totalidade, além de todas as divisões e limitações, e todos os teus desejos se dissolverão nisso, pois o maior contém o menor. Por isso, encontra-te; pois te encontrando, encontras tudo.

Todos estão felizes em ser. Mas poucos conhecem a sua totalidade. Tu a conheces quando acolhes na tua mente "Eu sou, Eu sei, Eu amo" com a vontade de atingir o mais profundo significado destas palavras.

Q: Posso pensar que sou Deus?

NM: Não te identifiques com nenhuma idéia ou pensamento. Se por Deus queres dizer o Desconhecido, então diz simplesmente: "Eu não sei o que eu sou". Se conheces Deus como sendo o que és, não precisas dizê-lo. O melhor é o simples "Eu sou". Insiste nele pacientemente. Aqui a paciência é sabedoria; não penses em fracasso. Não pode haver fracasso nesta empreitada.

Q: Mas os meus pensamentos não deixam.

NM: Não lhes prestes atenção. Não lutes contra eles. Apenas não faças nada, deixa-os estar (e se irem), o que quer que sejam. Quando lutas com eles estás a dar-lhes vida. Ignora-os. Olha através deles. Lembra-te de te lembrares: "o que quer que aconteça acontece porque eu sou". Tudo te lembra que és. Para experienciares tu tens de ser. Não precisas parar de pensar. Apenas parar de estar interessado (emocionado, envolvido, como se pudesse fazer alguma coisa a respeito). É o desinteresse que liberta. Não te segures (nada de esforço); isso é tudo. O mundo é feito de anéis, mas os ganchos (que te prendem) são todos teus (feitos por ti). Endireita os teus ganchos e nada irá te deter: deixa de lado os teus vícios (de imaginar, se emocionar, de crer em ilusões). Não há nada mais para deixar de lado. Pára a tua rotina da aquisição, o teu hábito de esperar resultados (isto é ‘deixa a Deus os frutos de tua ação’) e a liberdade do universo será tua. Sê sem esforço.

¨Q: Mas a vida é esforço. Há tantas coisas para fazer.

M: O que precisa ser feito, tu farás mesmo que não queira (pois não decidimos). Não resistas. O teu equilíbrio deve ser dinâmico, baseado em fazer apenas o que tens de fazer momento a momento. Não sejas uma criança que não quer crescer. Gestos estereotipados (copiados, imitados, rituais, cerimoniais etc.) e posturas (corporais ou psicológicas) não irão te ajudar. Confia inteiramente na tua clareza de pensamento, pureza de motivação e integridade de ação. Não poderás fazer mal. Vai além e deixa tudo o mais para trás.

Q: Mas pode alguma coisa ser deixada para trás para sempre?

NM: Tu queres qualquer coisa, como um êxtase eterno. O êxtase vem e vai, necessariamente, pois o cérebro humano não consegue agüentar a tensão por muito tempo. Um êxtase prolongado rebentaria com o teu cérebro a não ser que este seja extremamente puro e sutil. Na natureza nada está parado; tudo pulsa e flui, aparece e desaparece. Coração, respiração, digestão, sono e despertar, nascimento e morte, tudo vem e vai em ondas (num fluir eterno). Ritmo, periodicidade, harmoniosa alternatividade de extremos, essa é a regra. Não adianta revoltar-se contra o padrão da vida. Se procuras o imutável, vai além da experiência. Quando eu digo: lembra-te sempre de "Eu sou”, eu quero dizer: "volta a ‘Eu sou’ repetidamente". Nenhum pensamento é o estado natural da mente; apenas o silêncio é. Não a idéia de silêncio, mas o silêncio, ele mesmo. Quando a mente está no seu estado natural, reverte ao silêncio espontaneamente e, depois, toda ‘experiência’ acontece sobre o fundo do silêncio (pois não há mais o ruído produzido pela interferência do ‘eu’).

Agora, aquilo que aprendeste aqui se torna a semente. Podes esquecê-lo, aparentemente. Mas irá viver e, na estação devida, irá brotar e crescer trazendo flores e frutos. Tudo acontecerá por si mesmo. Não precisas fazer nada, apenas não evitar (não escolher, não ter preferência por) nada.

O mundo existe somente como um sonho em minha Consciência.
O que quer que tenha uma forma se constitui tão somente de
limitações imaginadas em minha consciência. Por si mesmo nada tem existência. Tudo precisa de sua própria ausência. Ser (viver), é ser distinguível (diferente dos demais), estar aqui e não lá, é ser agora e não depois, ser assim e não assado (mas somos o que somos; nada pode mudar isso). Como a água é moldada pelo vaso que a contém, assim também todas as coisas (fatos, pensamentos etc.) são determinadas por suas condições próprias.


O Puro Ser preenche tudo e é além de tudo. Toda limitação é imaginária (ilusão); somente o ilimitado é real. O mundo não é nada mais que um faz de conta, um show cheio de ‘glitter’ (atrativos) e vazio. Ele é e, ao mesmo tempo, não é. Ele está lá pelo tempo que eu queira vê-lo e tomar parte nele. Quando eu deixo de me importar (de me interessar por ele), ele se dissolve. Ele não tem qualquer causa e não serve a qualquer propósito. Ele só acontece quando estamos mentalmente-ausentes (distraídos). Ele se parece exatamente com o que é, mas não há qualquer profundidade nele, qualquer sentido. Somente o sobre-observador (a subjetividade absoluta) é real, chame-o Eu ou Atman. Para o Ser, o mundo não é mais que um show colorido, o qual ele curte “infinitamente” enquanto dure, e o esquece quando ele se vai. O que quer que aconteça no palco faz o ‘eu’ encolher-se aterrorizado ou rolar de rir no chão, e, ainda assim, todo o tempo ele está atento ao espetáculo, esquecido de que tudo é apenas um show. Contudo, o Eu, sem desejo ou medo, o aprecia tal qual ele se apresenta (sem interferir com julgamentos e avaliações, suposições e crenças).

O universo é um palco sobre o qual um drama mundial está sendo representado. A qualidade da performance (do desempenho) é tudo o que importa; não o que o ator diz ou faz, mas como ele o faz e diz. Desportistas parecem fazer um tremendo esforço: ainda assim seus únicos e inconfundíveis motivos (‘leit-motive’) são jogar e mostrar o que sabem fazer.

Tudo acontece como é necessário, e ainda assim nada acontece. Eu faço o que parece ser o necessário, mas ao mesmo tempo eu sei que nada é necessário, que a vida em si mesma é uma fantasia.

Você me vê aparentemente funcionando, agindo. Na realidade, eu somente olho (observo apenas como testemunha, sem nunca poder interferir). O que quer que seja feito (que esteja acontecendo) está apenas acontecendo no show, no palco. Contentamento e tristeza, vida e morte, eles todos são reais para o homem limitado; para o Eu, eles estão todos no show, são o show, tão irreais quanto o show em si mesmo. O Eu percebe o mundo como você o percebe, mas você acredita estar nele (pela interpretação falha das coisas do mundo), enquanto Eu o vejo apenas como uma gota iridescente (brilhante, colorida) na vasta imensidão da consciência.

Tudo o que vive, trabalha para perpetuar e expandir a consciência (mesmo inconscientemente). Este é todo o significado do mundo. É a verdadeira essência do Yoga - sempre elevando o nível de consciência, descobrindo novas dimensões, com suas propriedades, qualidades e poderes. Neste sentido, o universo inteiro se torna uma escola.

De uma barra de ouro, você pode fazer muitos ornamentos, mas, cada um, permanecerá sendo ouro. Do mesmo modo, em qualquer papel que eu possa estar desempenhando e em qualquer função que eu possa estar representando – eu permaneço o que sou: o “Eu sou” imovível, imperturbável, independente, livre. Tudo, o que chamamos de universo, natureza, tudo é minha criatividade espontânea. O que quer que aconteça, acontece. Mas minha natureza é tal que tudo termina em contentamento.

O Mundo que eu percebo é inteiramente privado (particular, intimo), um sonho (apenas meu). O mundo que você percebe é de fato um
mundo pequeno. E ele é inteiramente particular (seu). Tome-o como um sonho e acabe com ele. Não é a idéia de um mundo total uma parte de seu mundo pessoal? O universo não vem para dizer que você é parte dele. É você quem inventou uma totalidade para conter você como uma parte. Na verdade tudo o que você conhece é seu próprio mundo privado, não importa quão belamente você o tenha mobiliado com suas idéias, medos, imaginações, ilusões e expectativas.
Este mundo é pintado por você sobre a tela da consciência e é inteiramente seu próprio mundo privado.  

Saber que o filme (o mundo) é apenas um jogo de luz sobre a tela, traz a libertação da idéia de que o show é real.  

Considere. O mundo no qual você vive, quem mais sabe sobre ele (totalmente) como você? Dentro da prisão de seu mundo aparece um homem que lhe diz que esse mundo de dolorosas contradições,  que você criou, não é nem contínuo nem permanente e está baseado em um mal-entendido (ilusões). Ele insiste com você para que você o abandone. Você entra nesse mundo esquecendo (nem sabendo) o que você é, e você sai dele conhecendo a si mesmo como você é. Não há, nele, qualquer realidade. Ele não perdura (na consciência de quem desperta).  

O mundo não tem qualquer existência separada de você. A cada momento ele não é senão um reflexo de você mesmo. Você o cria; você o destrói. Seu universo pessoal não existe por si mesmo. É apenas uma visão limitada e distorcida do real.

Você não é do mundo; você nem mesmo está no mundo. O mundo não é; você sozinho é. Você cria o mundo em sua imaginação como um sonho. Como você não pode separar o sonho de si mesmo, assim também você não pode ter um mundo exterior independente de si mesmo. Você é que é independente, não o mundo. Não tenha medo de um mundo que você mesmo criou.

Busque e você descobrirá a Pessoa Universal que é você mesmo, e infinitamente mais. De qualquer modo, comece realizando que o mundo está em você, e não você nele. Seu corpo pessoal é uma parte na qual o todo está maravilhosamente refletido.

Mas você tem também um corpo universal. Você nem mesmo pode dizer que não o conhece, porque você o vê e o experiencia todo o tempo. Somente você o chama de “o mundo” e está com medo dele. Ambas, a anatomia e a astronomia, descrevem você.
Você conhece o mundo exatamente como você conhece seu corpo – através dos sentidos. É sua mente que separou o mundo de fora, limitado por sua pele, do mundo de dentro e os colocou em oposição.

O mundo não é mais que o reflexo de minha imaginação. O que quer que eu queira ver, eu posso ver. Mas porque eu deveria inventar padrões de criação, evolução e destruição? Eu não preciso delas. O mundo está em mim, o mundo sou eu mesmo. Eu não tenho medo dele e nem qualquer desejo de trancá-lo em um filme mental.

Imagine-se em uma densa floresta cheia de tigres e você em uma forte cela de aço. Sabendo-se bem protegido pela cela, você assiste aos tigres sem medo. A seguir, você encontra os tigres presos na cela e você perambulando na floresta. Finalmente, a cela desaparece e você monta os tigres!

O que eu pareço ser para você existe apenas em sua mente. Eu sou um sonho que pode acordá-lo. Você terá de provar dele em seu próprio acordar.  

Desista de tudo e você ganhará tudo. Então a vida torna-se aquilo que se supõe que ela seja: pura radiação de uma fonte inexaurível. Nessa luz, o mundo aparece difuso como um sonho (que ele é).  

Desejo e medo vêm da visão do mundo como separado de mim mesmo. Assim como você pensa ser, do mesmo modo você pensa que o mundo seja. Se você se imagina separado do mundo, o mundo aparecerá como separado de você e você experimentará desejo e medo. Eu não vejo o mundo como separado de mim e assim não há nada para eu desejar ou temer.  

Não há caos no mundo, exceto o caos que você cria em sua mente. Ele é autocriado no sentido de que em seu verdadeiro centro há uma idéia de você mesmo como algo diferente e separado das outras coisas. Na realidade você não é nem uma coisa nem separado.

Enquanto eu vir o sonho como real, eu sofrerei sendo escravo dele.
Ambos, sono e vigília, são nomes errôneos. Nós estamos apenas sonhando. Só o ‘gnani’ (o meditador profundo) conhece a vigília verdadeira e o verdadeiro sono. Nós sonhamos que estamos acordados; nós sonhamos que estamos dormindo. Os três estados são somente variedades de estados de sono (os diferentes níveis de consciência). Tratar tudo como um sonho, liberta. Quando você considera seus sonhos (qualquer sonho, seja dormindo ou acordado) como realidade, você se torna escravo deles. Por imaginar que você nasceu, que é isso ou aquilo, você se torna escravo dessa imaginação e desse isso ou aquilo. A essência da escravidão é imaginar a si mesmo como sendo um processo, que tem passado e futuro, que tem história. Na verdade nós não temos história, não somos um processo, não desenvolvemos, não decaímos; assim veja tudo como um sonho e permaneça fora dele.

Saber que você é um prisioneiro de sua mente, que você vive em um mundo imaginário, um sonho de sua própria criação, é o lago da sabedoria.

A causa do sofrimento está na identificação do percebedor com o que percebe ao seu redor, no mundo externo e no mundo interno. É dele que nasce o desejo, e, com o desejo, a ação cega (porque baseada em ilusões) de resultados impensáveis, imprevisíveis. Olhe ao redor, observe e analise profundamente o que você vê, e você perceberá que o sofrimento é uma coisa feita pelo próprio homem.

Ninguém sofre ao assistir a um filme; somente a pessoa que se identifica com ele. Não se identifique com o mundo e você não sofrerá.

Enquanto ele dura, o sonho tem um aspecto temporal. E é nosso desejo de mantê-lo, que cria o problema. Deixe ir. Pare de imaginar que o sonho é seu. Deixe o filme desenrolar-se até o verdadeiro fim. Você não pode ajudá-lo (interferir). Mas você pode reconhecer que o sonho é um sonho, e não carimbá-lo com o selo de realidade.

No presente você está perdido, e, portanto em perigo, pois para um perdido, a qualquer momento algo pode acontecer. É melhor acordar e ver sua situação real. Que você é, você sabe. O que você (o Eu) é, você não sabe. Descubra o que você é (e você estará livre). (‘Conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará’).

Minha intenção de acordá-lo é o link (a ligação) entre nossos respectivos sonhos). Meu coração quer que você acorde. Eu vejo você sofrendo em seus sonhos e eu sei que você deve acordar para terminar seus pesadelos. Quando você vê seu sonho como sonho, você acorda. Mas em seu sonho eu não estou interessado. Para mim é o bastante saber que você deve acordar. Você não precisa trazer seu sonho para uma conclusão definida, ou torná-lo nobre, ou feliz, ou belo; tudo que você precisa é realizar (se convencer) que você está sonhando. Pare de imaginar, pare de acreditar (de ter esperanças, medo, remorsos, expectativas, emoções); acorde! Veja as contradições, as incongruências, a falsidade e o sofrimento do ente humano (nesse sonho que é a vida), e sua necessidade de ir além (do sonho).

Em sonho você ama alguns e não ama outros. Acordado (liberto das ilusões) você descobre que você é o próprio amor, que envolve e inclui tudo. O amor pessoal, não importa quão intenso e genuíno seja, invariavelmente desaparece; o amor de quem se libertou é incondicional, é amor por tudo.  

Este é o coração da questão: Enquanto você acredita que só o mundo externo é real, você permanece seu escravo.  Simplesmente compreenda que o que você vê não é o que você é. As aparências se dissolverão sob a investigação, e a realidade virá à superfície. Você não precisa queimar a casa para abandoná-la. Basta sair. Somente quando você não pode ir e vir livremente que a casa se torna uma prisão. Eu me movo para dentro e para fora da consciência fácil e naturalmente, e assim para mim o mundo é uma casa (da qual posso sair quando quiser), não uma prisão.

Nada no sonho é feito por mim ou por você.

Enquanto você acreditar que é um corpo, você encontrará causas (motivos) para tudo e sofrerá. Eu não estou dizendo que as coisas não têm causas. Cada coisa tem causas inumeráveis. É como é, porque o mundo é como ele é. Cada causa, em suas ramificações, cobre o universo (Não há causas para o sofrimento e a ignorância) exceto sua ignorância de seu ser real (do ser que realmente você é), o qual é perfeito e além de toda causação. Pois o que quer que aconteça, todo o universo é responsável e você é a fonte do universo. Tudo o que acontece é a causa de tudo o que acontece. As causas são inúmeras; a idéia de uma causa única é ilusão.  

Porque você fala de ação? Você alguma vez está em ação? Algum poder desconhecido atua e você imagina que você está agindo. Você está meramente assistindo (testemunhando) o que acontece, sem ser capaz de influenciá-lo de nenhuma forma. (‘É o Senhor que opera em nós o pensar, o querer e o fazer’). Pára de imaginar a ti mesmo como sendo ou fazendo isso ou aquilo, e a realização (a compreensão, a iluminação), de que tu és a fonte e o coração de tudo, se derramará sobre ti.

O homem sábio nada toma como sendo seu (como se fosse fruto de sua ação, de sua escolha ou decisão). Quando em algum tempo ou lugar algum milagre (qualquer feito ou ação) é atribuído a alguém, o sábio não estabelecerá qualquer vinculo de causa entre eventos (o fato) e seu presumido autor (porque ninguém age ou escolhe ou decide por si mesmo), nem permitirá que qualquer conclusão seja tirada. Tudo acontece como acontece porque tem de acontecer; tudo acontece como acontece porque o universo é como ele é.

Você se imagina sendo e fazendo tudo idêntico (repetindo as mesmas respostas aos mesmos estímulos). Não é assim. A mente e o corpo movem-se e mudam e causam movimentos e mudanças em outras mentes e outros corpos, e isso é chamado de fazer, de ação. Eu vejo que é da natureza da ação criar outra ação, como fogo que continua queimando. Eu não ajo nem sou causa de outros agirem; eu estou constantemente alerta de tudo o que acontece.
O que é feito é um fato; o fazedor é um mero conceito. Sua própria linguagem mostra que enquanto o feito é certo (é um fato), o fazedor é dúbio, impreciso; alternar responsabilidades é um jogo peculiarmente humano. Considerando a infindável lista de fatores requeridos para que algo aconteça, só se pode admitir que tudo seja responsável por tudo, não importa quão remoto esteja. O fazer é um mito nascido da ilusão do “eu” e do “meu”. Eu não sinto que eu esteja falando. Apenas existe fala acontecendo; isso é tudo. Você realmente fala? Você ouve a si mesmo falando e você diz: ‘eu estou falando’. Eu não tenho qualquer objeção às convenções de sua linguagem, mas elas distorcem e destroem a realidade. Um modo mais acurado de dizer seria: “Há fala, há trabalho, há movimento, há ir e vir”. Para que qualquer coisa aconteça o universo inteiro deve coincidir. É um erro acreditar que qualquer coisa em particular possa causar um evento. Toda causa é universal. Eu estou totalmente seguro de que as coisas acontecem como elas têm de acontecer porque o mundo é como ele é, o mundo apenas é assim. Para afetar o curso dos eventos, eu devo trazer um fator novo para o mundo e tal fator só pode ser eu mesmo, o poder do amor e da compreensão focalizado em mim.
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