sexta-feira, 28 de maio de 2010

COMO ENTENDER O CHAMADO (17)

‘... Docemente cresceu e se espalhou em torno de mim a paz e o conhecimento além de todo o argumento da terra (sabedoria além de todo conhecimento terreno), e eu sei que a mão de Deus é a promessa da minha (é o que a minha será pelo percebimento), e sei que o espírito de Deus é irmão do meu e que todos os homens já nascidos são meus irmãos (todos somos um)... e que a criação sobrevive graças ao amor... De repente, me senti cheio de paz, alegria e conhecimento, transcendendo (indo além de) toda a arte e sabedoria da terra.’ (Whitman) (somos todos da mesma natureza de Deus).


‘Na verdade eu diria que apenas na perfeita incontaminação e solidão da individualidade (a mente não contaminada, só, livre dos sentidos, dos desejos, lembranças e pensamentos), pode surgir, positivamente, a espiritualidade da religião (que, antes, era mais por costume ou desejo de respostas). Somente aqui, e nessas condições, a meditação, o êxtase devoto, o vôo elevado (consciência una). Somente aqui,a comunicação com os mistérios (encontro de todas as respostas), os problemas eternos: de onde? para onde? Sozinho, o pensamento silencioso (apagado, cessado) e a aspiração (o desejo de chegar) e, então, a consciência interior (o Eu Sou), com sua inscrição prévia invisível (o Cristo, que desde sempre está ali, mas não percebido, ‘invisível’ para nós), em tinta mágica (não o víamos e agora passamos a ver), irradia suas linhas maravilhosas para os sentidos (mostra-se e o percebemos)... e todas as afirmações, igrejas e sermões, desaparecem como vapores (tudo que antes conhecíamos não tem mais valor ante a grandeza do percebimento). As bíblias podem afirmá-lo e os clérigos expô-lo, mas é exclusivamente mediante o trabalho do eu isolado (ninguém chega à verdade pelos trabalhos da religião, através de suas práticas, mas pelo exercício da meditação, sozinho) que se entra no puro éter da veneração, que se alcança os níveis divinos, que se comunga com o supremo (a percepção da verdade do que somos)... Tu, Tu, enfim, conheço!’ (Whitman).

‘... visto (à luz do Cristo interior, isto é, sob o ponto de vista de um iluminado), tudo é perfeito, inclusive aquilo que visto fora dessa luz parece imperfeito...’ (Dante) (‘... do perfeito tirando o perfeito, o que resta é perfeito... ’, de um cântico do bramanismo; isto é, tudo é perfeito, embora não o compreendamos; só os iluminados compreendem).

‘Quando os seus pensamentos se tornarem fixos (cessarem de fluir) você perceberá, dentro de si mesmo, a consciência absoluta (consciência total, a divindade, a iluminação, Deus). Existe, realmente, um fato concreto e reconhecível, ou seja, um estado de consciência que já foi experimentado inúmeras vezes e que, para os que por ele passaram, ainda que em leve grau, pareceu superior a toda uma vida de devoção... Nesse instante, tornei-me consciente do surgimento, dentro de mim, de uma região que, em certo aspecto, transcendia os limites comuns da personalidade (além do ego), e à luz da qual minhas próprias idiossincrasias de caráter, defeitos, qualidades, limitações, já não tinham importância (tudo é sem importância, comparado a isso): uma absoluta liberdade em relação à mortalidade (não há morte), seguida de indescritível sentimento de felicidade e calma (bemaventurança). Imediatamente vi, ou senti, que essa região do eu, existente dentro de mim, existe igualmente em todos os demais (somos iguais; temos as mesmas possibilidades). Diante dela, as simples diferenças de comportamento, que geralmente diferenciam e dividem os homens (ocasionando toda espécie de conflitos, até as guerras), tornaram-se indiferentes (sem importância) e abriu-se um campo no qual todos podiam encontrar-se, no qual todos eram verdadeiramente iguais... Se eu pudesse transmitir (aos demais) a metade do esplendor que o havia inspirado (ao livro que publicou a seguir), seria bom e não teria de lutar para escrever nada mais (pois ele conteria tudo o que se precisa saber para se chegar ‘lá’)... ’ (Edward Carpenter) (a consciência da presença de Deus em nós traz bem-aventurança e livra-nos do medo da morte, pois ficamos cientes de que ela não existe; todos somos iguais, o Cristo é um em todos e todos somos um só, e em todos está a mesma possibilidade de chegar à iluminação).

‘...acabadas todas as penas, abrindo-se dentro de mim um profundo oceano de felicidade... todas as coisas são transfiguradas, cantando felicidade sem fim (pelo percebimento). Naquele dia, no dia da tua libertação (‘conhecereis a verdade e a verdade vos libertará’), ela (a verdade, a libertação, o Cristo) virá a ti em lugar que desconheces, sem que saibas em que tempo (Jesus disse: ‘estai preparados, pois não sabeis nem a hora, nem o lugar’)... tu estarás livre para sempre... deixa que a felicidade te invada... a morte já não te separará daqueles a quem amas (perceberás que todos somos um; não há separação)... o mundo da igualdade... da felicidade total... ’ (Carpenter). (o percebimento da verdade nos liberta de todas as dores; como afirmou Buda, ‘a iluminação é o fim de todo o sofrimento’, e Jesus, ‘conhecereis a verdade e a verdade vos libertará’; o ‘mundo da igualdade’, pois então perceberemos que todos somos iguais; mais ainda: um só).

‘(O Amuleto místico de Pascal): Ano da graça de 1654, segunda-feira, 23 de novembro, dia de São Clemente, Papa e mártir... desde cerca das dez horas e meia da noite até cerca de meia-noite e meia... FOGO... FOGO (transfiguração, iluminação, como Jesus, Moisés, Buda, Francisco de Assis). Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacob, não dos filósofos e sábios. Certeza, alegria, certeza, sentimento... alegria, paz (sentimentos indizíveis porque não existe meio de comunicá-lo a ninguém; a verdade é incomunicável, é aquilo que realmente somos, mas que temos de perceber por nós mesmos). Deus de Jesus Cristo, meu Deus e teu Deus... Esquecido do mundo e de tudo (para a meditação tem-se que esquecer de tudo, o que se obtém fazendo cessar o pensamento, fato que afasta o eu pensante) exceto de Deus. Ele só é encontrado nos caminhos dos Evangelhos. GRANDEZA DA ALMA HUMANA (por reconhecê-la o próprio Deus). Pai justo, o mundo não te conhece, mas eu te conheci (tive o percebimento). Alegria, alegria, alegria, lágrimas de alegria. Eu não me separarei jamais de Ti... Meu Deus, não me abandones, não me deixes separado de ti eternamente. Esta é a vida eterna que se ganha depois de te conhecer, o único Deus verdadeiro e aquele que tu enviaste – Jesus, o Cristo (o percebimento traz uma vida repleta de felicidade e alegria; e cessa qualquer receio da morte, pois fica-se sabendo que a vida é eterna; e conhecendo-se Deus, conhecemos que nós o somos). Eu me havia separado dele; eu o havia abandonado, crucificado (não tinha o percebimento); que eu não seja jamais separado (sem o percebimento, estamos separados; com ele, tudo é um); ninguém se salva a não ser pelo caminho dos evangelhos... RENUNCIAÇÃO TOTAL E DOCE... (renuncia-se àquilo que chamamos vida pois o que se tem, agora, é muitíssimo mais belo e mais prazeroso). Submissão total a Jesus Cristo e a meu Diretor (agora a ação é totalmente correta; não há o que escolher; temos plena percepção de que a consciência una, Deus, é que opera em nós; por isso, submissão total). Eternamente em alegria por um dia de exercício sobre a terra (esse instante jamais é esquecido, pois nos transforma radicalmente; é a ressurreição, o nascer de novo)... jamais esquecerei o que me ensinaste (como todos afirmam, o que se aprende naquele instante é mais do que se aprenderia em muitos anos com os melhores mestres). Amém. ’ (Pascal) (a percepção, por mais rápida que seja, traz alegria para sempre; cessam todos os problemas).

Pascal, após certa noite, esquivou-se do mundo; passou a viver recluso. Quando morreu, um criado encontrou, costurado com cuidado dentro da bainha de seu gibão, um pergaminho com os dizeres acima; esse pergaminho recebeu o nome de ‘amuleto místico de Pascal’ e está, hoje, na Biblioteca Nacional, em Paris. A reclusão entende-se quando nos lembramos de outros místicos, como Jesus, que se retirou para o deserto, Paulo, que foi viver entre tecelões, e outros mais que buscaram um tempo, a solidão, para assimilar a ‘luz’ que lhes viera.
(Continua)

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