quarta-feira, 26 de maio de 2010

COMO ENTENDER O CHAMADO (16)

CONTINUAÇÃO DAS TENTATIVAS DE ENTENDER AS PALAVRAS DE JESUS...

‘... (orando pelos discípulos): Pai, santifica-os pela verdade.’ (Jo 17:17) (‘Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará’; isto é, nos tornará sãos, santificados).


‘...se me conhecêsseis, também, certamente, conheceríeis ao Pai.’ (Jo 14:10)... como, pois, dizeis: mostra-nos o Pai? Não credes que eu estou no Pai e o Pai em mim? As palavras que vos digo não as digo de mim mesmo, mas o Pai que permanece em mim as diz..’. (Jo 14:20) (outra prova de que Jesus ensinou que Deus está em nós e que nada escolhemos; como afirmam os místicos, somos a própria divindade; se conhecêssemos o Cristo, a iluminação, saberíamos disso e que todos somos um).

‘...Naquele dia (da iluminação) conhecereis que eu estou no Pai, e vós em mim e eu em vós.’ (Jô 14:20) (idem; saberemos, então, que todos somos um).

‘Conheço minhas ovelhas e elas me conhecem, como meu Pai a mim conhece e eu conheço o Pai (pelo percebimento)... Tenho, ainda, outras ovelhas que não são deste aprisco (que não perceberam ainda). Preciso conduzi-las também (ao percebimento), e ouvirão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor.’ (Jô 10:14ss) (ouvir a voz do Cristo é ter o percebimento; o que nos conduz a Deus é o próprio Deus, mas há aqueles que não chegaram ainda; porém todos somos iguais; então, pelo percebimento, haverá um só rebanho).

‘Queremos apedrejar-te por que, sendo homem, te fazes Deus. Replicou-lhes Jesus: Não está escrito na vossa Lei: Vós sois deuses? (Sl 81:6)...e a escritura não pode ser desprezada.’ (Jô 10:33ss) (nós o somos).

‘Interrogado pelos fariseus sobre quando havia de vir o reino de Deus, respondeu-lhes: O reino de Deus não vem com aparência exterior. Nem se dirá: Ei-lo aqui, ou Ei-lo acolá; pois o reino de Deus já está dentro de vós.’ (Lc 17:20) (sem comentário).

‘Não recolho meu conhecimento de cartas ou livros; eu os possuo dentro de mim mesmo; porque o céu e a terra, com todos os seus habitantes, e o próprio Deus, estão dentro do homem. ’ (J. Boheme) (este percebeu).

‘...enquanto os irmãos não se comprometerem com negócios...; não se habituarem a conversas fúteis; não sentirem preguiça; não freqüentarem grupos ou com eles forem tolerantes; não sentirem a influência de desejos pecaminosos; não se desviarem do caminho por coisas de menor importância, devemos esperar que os irmãos prosperem e não caiam...’ (Buda) (pois estão se aproximando do percebimento).

‘... a preocupação de acumular dinheiro, a ele escravizando os dias e as noites, eis a maior das fraudes da civilização moderna. ’ (Whitman) (isso é distração, obstáculo à meditação, à percepção daquilo que já somos).

‘... sem (auto) conhecimento não há meditação; sem meditação não há (auto) conhecimento’. (Buda) (são simultâneos: é o conhecimento daquilo que somos na realidade, mas ainda não percebemos).

‘Buscai primeiramente o reino de Deus e sua justiça, e tudo o mais virá por acréscimo.’ (Mt 6:33) (com o percebimento, vemos que de nada mais necessitamos; nada mais é necessário; é por esse motivo que se deve buscar, em primeiro lugar, o reino).

‘O reino de Deus é semelhante a um tesouro oculto no campo, que, certo homem, tendo-o achado, escondeu. E, transbordante de alegria, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo.’ (Mt 13:44) (como todos afirmaram, tudo o mais é nada em comparação com o percebimento; desfez-se de tudo, porque tudo o mais não é tão importante: está transbordante de alegria porque, agora, é bem aventurado).

‘...um homem que procura boas pérolas; e, tendo achado uma pérola de grande valor, vende tudo o que tem e a compra.’ (Mt 13:45) (idem).

‘Eis que vos digo um mistério: na verdade, nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao soar da última trombeta. A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e seremos transformados..’ (I Cor 15:51) (o percebimento é instantâneo; transforma a todos, e os que estão mortos para a verdade, isto é, que ainda não despertaram, ao perceberem a verdade despertarão, agora incorruptíveis).

‘Purifique sua alma de todo medo e esperança tola sobre as coisas da terra; mortifique o seu corpo, domine o amor-próprio e os apetites, e o olho do mais íntimo (Deus) começará a exercitar a sua visão clara e solene. Tudo aquilo que contribui para purificar a mente ajudá-lo-á a atingi-la (a visão, a consciência cósmica) e facilitará a aproximação e repetição desses felizes intervalos (Plotinus) (como todos os iluminados aconselham que façamos algo, isso talvez seja sinal de que devemos ter certa autonomia de vontade; usemo-la para nos aproximarmos do feliz momento; como afirmam eles, toda esperança sobre as coisas da terra é tola, pois tudo é incerto e não há segurança em nenhum lugar ou situação; estaremos plenos de felicidade quando o ‘olho do mais íntimo’ (onde o ego cessa) exercitar sua visão; a purificação da mente pode ser obtida pela meditação, que afasta o ‘eu’ e, com este, todo o lixo mental, todo o condicionamento).

‘Na verdade não convém que me glorie! Passarei, entretanto, às visões e revelações do Senhor. Conheço um homem em Cristo (isto é, que chegou lá), que, há catorze anos foi arrebatado até o terceiro céu... e lá ouviu palavras inefáveis, que não é permitido a um homem repetir (indizíveis, não há como comunicar a grandeza do que viu). Demais, para que a grandeza das revelações não me levasse ao orgulho, foi-me dado um espinho na carne... para me livrar do perigo da vaidade.’ (II Cor 12:1ss). (sem comentário).

‘O infinito (Deus) só pode ser apreendido por uma faculdade superior à razão (isto é, além do ego), que nos faz entrar num estado no qual você já não é mais o seu eu finito.’ (Plotinus) (você é, portanto, seu ‘Eu’ infinito, isto é, Deus; só quando somos Deus é que o apreendemos (como diz Eckhart). Lembrar-se de Paulo: Já não sou eu que vivo, mas o Cristo é que vive em mim).

‘...em primeiro lugar a alma deve retornar a si mesma (como se estivesse perdida e tivesse que encontrar seu caminho, o caminho de casa); isso se alcança pela prática das virtudes, cujo objetivo é despoluir (limpar) a mente (para que se torne semelhante) à semelhança com Deus e que conduz ao próprio Deus, pelas quais a alma se liberta da sensualidade (da ação dos sentidos, fato que elimina o ego)... Por meio de práticas ascéticas (meditação) o homem uma vez mais se converte num ser espiritual, livre de todos os pecados. Entretanto, ainda há um escalão mais alto: não basta ser sem pecado (isso apenas nos limpa a mente); é preciso converter-se em Deus (Eckart: ‘nos confundirmos com Deus’). Isto se alcança pela contemplação (meditação) do Ser Único ou, em outras palavras, por uma aproximação extasiada (em êxtase) desse Único. O pensamento (a imaginação, o intelecto, o ego) não pode chegar a isso... pois é apenas um estágio preliminar dessa aproximação (portanto, pensamento, intelecto, ego devem ser eliminados). E é apenas em estado de perfeita passividade e repouso (sem operações do ego; meditação) que a alma pode reconhecer e tocar (sentir) o Ser Divino. Para atingir esse fim mais alto, a alma necessita passar por um currículo espiritual. Iniciando na contemplação das coisas corpóreas, em sua multiplicidade e harmonia (isto é, conhecendo a vida, o mundo em sua diversidade; ‘compreendendo a totalidade da vida’, como diz Krishnamurti), retira-se para dentro de si mesma, nas profundezas de seu próprio ser (para dentro do eu)... Mas, o mais alto não está ainda aí... O último estágio é alcançado quando, na mais alta tensão e concentração, no silêncio e esquecimento de todas as coisas (sejam boas ou más: meditação), a alma acha-se apta a perder-se em si mesma (o eu não mais opera). Então, ela pode ver Deus, a fonte da vida, do ser, a origem de todo o bem, a raiz (origem) da alma. Nesse momento, a alma desfruta da bênção mais indescritível; é como se fosse banhada pela divindade (Plotinus). (‘virtudes que levam à semelhança de Deus’, isto é, que tornam a consciência pura, livre dos condicionamentos. ‘Não basta ser sem pecado’: isto, no dizer dos sábios, não retira o homem da multidão; só tranqüiliza a mente preparando-a para a meditação. ‘O pensamento, a imaginação, a razão, o intelecto, não podem chegar a isso’; são finitos e só uma faculdade infinita, isto é, algo além do ego, pode apreender o infinito. ‘Em perfeita passividade e repouso’: relaxamento externo e interno, isto é, na meditação; dentro de si mesmo, ‘no silêncio e esquecimento de todas as coisas’ (meditação); ‘na mais alta tensão e concentração’ - dizem os sábios que, somente quando a paixão é tão grande que o homem derrama lágrimas, é que a luz chega – ou, como afirma o bramanismo, ‘para se subir à presença do mestre, os pés devem ser lavados no sangue do (próprio) coração’. ‘Perder-se’: perder o ego, o ego cessa. ‘Poderá ver Deus’: ter o percebimento, a iluminação, ver que tudo, que cada ser é Deus).

‘...pois, quanto maior a importância que a alma atribuir ao que sente, compreende e imagina (às coisas do mundo, ao conhecido), e quanto maior o apego que a isso tiver, seja coisa espiritual ou não (coisas agradáveis ou desagradáveis, profanas ou sagradas, boas ou más) mais se afasta do bem supremo, mais demora em alcançá-lo.’ (João da Cruz).

‘...quanto mais a alma se preocupa em ligar-se às coisas criadas, nelas depositando sua força e confiança, por hábito ou inclinação (apenas sentimos confiança e segurança naquilo que já conhecemos, pelo nosso condicionamento cultural; mas segurança, seja física ou psicológica, não existe em nenhum lugar ou tempo), menos se dispõe a essa união, à união com o divino.’ (João da Cruz).

‘Não sou eu, o eu que sou, quem sabe estas coisas; mas Deus sabe das coisas em mim.’ (Jacob Boehme) (pois ‘eu e o Pai somos um’).

‘...pois Cristo, o filho de Deus, tem que se fazer homem (fazer-se você) e nascer dentro de você (pelo percebimento); de outro modo você estará num estábulo escuro (entre fezes e urina; na escuridão da ignorância) e aí continuará, procurando sempre por Jesus Cristo. Você olha para as estrelas, procurando Deus distante, nos céus’. (Boheme) (procura vã, pois ele está dentro de você (S. Agostinho) e, se você não percebê-lo aí, estará realmente na escuridão, ou ‘morrerá como um cão danado’, como assegurou Gurdjeff. ‘A vida só tem significado quando temos o percebimento’, como afirmou Krishnamurti).

‘Discipulo: Isso está ao nosso alcance, ou muito longe?

Mestre: Está em você (dentro de você mesmo e você o perceberá) se, por um instante, puder deixar de pensar e de desejar (meditação); então, ouvirá de Deus palavras indizíveis.

Discipulo: Como posso ouvir se não deixo de pensar e desejar?

M: Quando você afastar pensamentos e vontades de seu eu (pela meditação), surgirá o eterno no ouvido, na fala, na visão. E Deus ouvirá, falará e verá através de você (nossos olhos e ouvidos são os olhos e ouvidos de Deus). Você esquecerá sua própria audição, visão e fala, para só ver e ouvir a Deus.

D: Como, se ele está acima da natureza e das criaturas?

M: Quando você estiver no silêncio e na paz (meditação), você conseguirá.

D: O que me entrava que não consigo chegar a isso?

M: A sua vontade, a sua visão, audição, desejo e pensamento (que pela meditação podem cessar) sobre as coisas terrenas, trazem sua visão, audição etc. ao nível terreno de tal forma que você não consegue atingir... Há que caminhar pelo caminho mais difícil (a porta estreita e o caminho pedregoso), tomar o que o mundo rejeita, e não fazer o que o mundo faz... então, terá encontrado o caminho mais próximo para isso... pois (como disse Paulo) o caminho para o amor de Deus parece tolo para este mundo, mas é sabedoria para os filhos de Deus.’ (a sabedoria dada pelo percebimento).

(continua)

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