Carta de uma amiga
A amiga disse:
“... se a física quântica fala que não existe a realidade fora do observador, a realidade só existe no já”.
Cel: a física quântica afirma isso, amiga? Tem certeza? Se afirma, será que não estão querendo significar que “a realidade material” (a realidade que observamos, vemos, cheiramos etc) só existe quando há observador? Sem observador não existe matéria e a “realidade material” é a única que conhecemos e percebemos!
Mais uma coisa: a realidade é, exatamente, sempre “já”, pois não podemos ver, ouvir, cheirar, sentir... nem no passado, nem no futuro; todas as nossas percepções são “instantâneas”, num presente eterno, que não tem passado, nem futuro.
Amiga:
“... o autor fala que não podemos nunca ter memória do agora ou já, em um segundo tudo se torna antigo, então na verdade o que pensamos que somos é um aglomerado de memórias sendo depositada uma após a outra construindo uma realidade fictícia sobre nós mesmos, pois o ser é eterno, não passa , não acaba, não pode estar no passado, o personagem sim é finito”.
Cel: veja, amiga, embora o presente seja o único tempo que existe, pois ele é a eternidade em que já vivemos, e passado são apenas memórias, e futuro são apenas expectativas, em nosso modo (relativo) de compartimentar o tempo existe mesmo o presente? O que é o presente senão uma linha “invisível” e sem duração alguma, ligando o passado com o futuro? O “presente” é apenas o nome que damos à essa linha divisória. Quando o futuro “chega”, instantaneamente se torna passado, concorda? Assim, futuro não existe para nós senão como expectativas e quando “chega” se torna, instantaneamente, passado, e o passado não existe para nós senão como memória. O único que existe é a eternidade, um presente eterno.
Amiga:
“O que somos quando o corpo acaba? Quando a história do EGO não tem mais função?”
Cel: somos aquilo a que damos o nome de Deus, uma Consciência única, sem centro, sem periferia, que cria isso a que damos o nome de “universo material”, que não compreendemos qual sua finalidade (se é que existe alguma) e nem porque estamos “aqui”.
Amiga:
“Penso que isso é o que todos esses pensadores vem sempre alertar, assim como a Doutrina Espírita nos mostra: a obsessão, fixação do Espírito em um aglomerado de sentimentos de posse, raiva, egoísmo construídos pela memória dos vários personagens que viveu.”
Cel: o Espírito/Deus não tem memória, pois todo o tempo para ele é agora, como todo lugar é aqui. Para a Consciência do Universo, portanto, não existe nem passado nem futuro. Como recordar o passado se o passado para o Espírito é agora? Como ter expectativas quanto ao futuro, se o futuro é agora?
Amiga:
“Rohden enfatiza a total concentração no momento assim como os orientais falam da não dispersão, e total atenção, sendo a dispersão o maior dos pecados”.
Cel: pois era exatamente essa a concepção existente no primitivo cristianismo (o dos primeiros séculos): a atenção, a maior das virtudes; a distração, o maior dos pecados. Lembre-se das parábolas sobre a necessidade da atenção, a das virgens insensatas, a do ladrão que pode chegar a qualquer momento... Tereza de Ávila, a repetida recomendação que fazia às noviças era: “Atenção! Atenção! Atenção!”. É tb isso que o Budismo ensina: “abandone o filme emotivo-imaginativo”, significando permaneça no aqui-e-agora; não no passado, pelas emoções, nem no futuro, pela imaginação.
Como Rohden e os místicos orientais afirmam,
concentração/atenção no momento é o treinamento para o trabalho da meditação. “A mente é como um cavalo selvagem, como disse Krishina a Arjuna, no Bhagwad Gita, mas, com determinação e paciência, pode ser domada”. A tentativa de meditação não é apenas a tentativa de aquietar/domar a mente? Podemos acalma-la, com todos esses condicionamentos, que nos envolvem, e nos fazem estar todos os instantes pensando, falando, ouvindo, imaginando, avaliando, conceituando? Nunca, se não formos capazes de, com determinação e paciência, tentar. Temos de tentar acalmar o cavalo, para que a mente/ego se acalme, e a meditação chegue.
Lembre-se dos mestres Zen: “Lavar louça, lavando louça” e: “Chupar laranja, chupando laranja”.
Até mais. Abraços a todos.
domingo, 22 de maio de 2011
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